Precipitadamente, acreditei ter a clareza do sentimento e de
toda a capacidade de amar garantida pela sua existência. Certa de que o
controle sobre as coisas estava na habilidade em racionalizar, assumi o risco
em lançar mão das impalpáveis sensações de prazer e êxtase alternadas às de
pungência da dor.
Contruí um mundo inteiro sem alicerces.
Diante de mim, por entre os dedos, esvaíram cada uma das
muralhas que pensei protegerem-nos dos ataques. Vinham de dentro. Escorrem pelos degraus os cômodos, um a um, destituídos desse título ao desajustar de suas funções às necessidades.
O frio congelante do restar das paredes nos cômodos ficando
vazios, em equidade com a temperatura dos meus órgãos em falência. Os furos
aparentes que já sustentaram os armários e quadros, tão equivalentes ao abismo
que já foi a base para uma vida inteira. A unidade, dividida em pequenas partes encaixotadas em embalagens fechadas, como mentes vácuo, rotuladores e seus papelões sem argumentos e sem aderência, desclassificados, mal organizados.
Queima de
estoque dos pequenos itens que já compuseram um amor, oferta barata por qualquer
chance de vida, sem crédito, descontando em mim a dor, cobrança eterna, altos custos, falência!
Desmontam-se sonhos com ferramentas de marcenaria; sem
sustentação a cada torcer que desse certo e distorcer de parafusos e realidades. Transportando os móveis; sofás; armários e estantes, sem base para retratos de
família, um mundo inteiro sendo levado em carga a frete. Movimento do corpo, inércia de atitudes.
Passam gatunos pela calçada sem que os espantem os latidos uivos do cachorro, tal e qual se instalaram em partes substanciais do nosso território.
No alto do pé direito, apagadas as luzes nos lustres. Interruptores de uma temporada de um teatro decadente sem mais apresentações de ilustres participações especiais. Retiradas as cortinas, rasgadas, sem trilho.
O último bater da porta ecoa o impacto perturbador do fim do mundo, daquele nosso mundo, fim do nós.
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